segunda-feira, 15 de outubro de 2012

FLORES AZUIS



 PARA A PROFESSORA  LÉA 



   A carranca e os gestos curtos explodiam em palavras de ordem. Em plena ditadura Ela afirmava que devíamos lutar pela liberdade. Na minha ingenuidade pensava e sentia o sentido de li-ber-da-de como algo grande e importante, pra que a defendesse assim. 
  Todos os dias me perdia tentando entender o porquê dela nunca brincar, nem alegrar-se com nada. O máximo que fazia era esticar o cantinho da boca e levantar as sombrancelhas, quando fazíamos algum comentário sobre nossa vida de meninos. 
   Sempre nos aconselhava: _ Não sejam soldadinhos de chumbo, busquem o giro da bailarina. Ela é uma flor diferente nesse jardim. 
   No dia dos professores de 1976,  todos levaram rosas. Eu não tinha dinheiro pra comprar flores, mas sentia que rosas eram comuns pra Ela. Desenhei Flores Azuis, no avesso de um papel de presente do dia das crianças, e entreguei, discretamente, dobradinho em suas mãos, depois dos meus colegas de classe. Todos a abraçaram e beijaram, mais com receio do que por simpatia. Foi quando Ela, austera, pediu silêncio e disse: _ Meu abraço de Professora, que educa pra liberdade, vai para os olhos mais indagadores que já vi. Nesse momento, Ela atravessou a sala, veio em minha direção, me abraçou, olhou nos meus olhos tortos e disse: _ Minha Bailarina! E a cena daquele sorriso largo, nunca saiu da minha memória.


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