Conhecemos os meninos de Dalton Trevisan, após lembranças de um futuro no presente, tomados pelos eufemismos dos sabores da infância, ao falarmos do acre-doce desejo, concentrado na ponta do punhal da paixão. Parecem incompatíveis, paradoxos de salvação e de perdição. Eis que afirmamos, sem nenhum compromisso com a coerência, para tal inocentes, um uníssono: 'não'.
Revivemos, assim metáforas de um conto nada pueril: O menino e Estacha; a água e a terra; a cigarra e a formiga; as folhas de couve e as pelotas modeladas, para o estilingue, eis o arsenal para o enfrentamento. Mas nada, nenhuma figura de linguagem é mais significativa que o caco de vidro.
Entre o menino e Estacha (menina desejosa e desejante que é anunciada trajando um vestido azul desbotado e quase transparente de tão gasto, contando cinco dias na casa - esse inconsciente familiar), existe uma vontade que sangra. Além disso, ela manipula a água, na posição de lavadeira, enquanto, simultaneamente, ele vai bulindo a terra. Todos os elementos telúricos desenham ações de sujar e limpar; perseguir e encontrar; ver e tocar. Ela olhava-o sem escândalo, quem sabe um pouco deslumbrada. Ele se aproximava numa querência, rolando na palma da mão um bocado de barro preto. Ela empilhava a lenha ao lado do fogão.
Saboreando morangos, o perseguidor e a perseguida caminham dentro do bosque escuro. Ela promete uma ameaça: _ Conto pra sua mãe. Olhe que eu conto.
O adiamento do contar, constrói um texto-denunciador, que delata, ao mesmo tempo que a cigarra dilata de encantada, para a tropa de formigas-lavadeiras...
Ela defendeu-se com um caco de vidro. O pedaço de vidro caído entre os dois. Ele recolheu as pelotas no saquinho de pano, ela deu-lhe as costas e sacudiu o pó do vestido.
Ele a olhou, ela não. As formigas seguiram e ciciou a cigarra.
O caco de vidro ficou inteiro dentro dos dois.
O caco de vidro ficou inteiro dentro dos dois.
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